26 novembro, 2008

La Donna è Mobile - Maria Teresa de Filippis

Maria Teresa de Filippis a bordo de uma Maserati, em Monza, 1958"Qual piuma al vento", Maria Teresa de Filippis escreveu um breve mas significativo capítulo da história da Fórmula 1. Esta bela mulher de Nápoles, hoje com 82 anos e avó de dois netos, se tornou, em 1958, a primeira mulher a disputar um Grande Prêmio válido pelo Campeonato Mundial de Fórmula 1. Longe de ser uma jogada de marketing, até porque, naquele tempo, ter uma mulher ao volante poderia ser, até, negativo para a reputação de uma escuderia, Maria Teresa conquistou seu espaço com resultados expressivos nas categorias nacionais da Itália pilotando um OSCA e uma Maserati particulares. Sua primeira vitória foi a bordo de um FIAT 500, só porque seus irmãos apostaram que ela não conseguiria ser mais rápida que eles ao volante.

A trajetória foi difícil, como era para qualquer mulher no mundo masculino da década de 50. No GP da França de 1958, já na Fórmula 1, foi impedida pelo diretor de prova a participar do evento, porque "o único capacete que uma mulher deveria usar é aquele do cabelereiro".

Capa do livro Sob influência do piloto da Ferrari, Luigi Musso, Maria Teresa foi contratada pela equipe oficial da Maserati para disputar provas de Fórmula 1, em 1958. Sua estréia foi em Spa-Francorchamps, largando em décimo nono e terminando em décimo. Ao todo, foram 7 participações em Grandes Prêmios (dois deles extra-campeonato, com destaque para um quinto lugar no GP de Siracusa), e 3 largadas válidas pelo mundial.

Em 1959, o piloto francês Jean Behra, responsável pela equipe Porsche na Fórmula 1, a convidou a pilotar seus carros. Maria Teresa não obteve classificação para o GP de Mônaco daquele ano, e, com a morte de Behra em corrida disputada em AVUS, ela decidiu abandonar o esporte. Constituiu família, e desde 1997 é vice presidente do Clube dos ex-Pilotos de Fórmula 1 e é presidente do Clube Maserati, comparecendo a eventos relativos ao tradicional construtor.

Maria Teresa em evento do Clube Maserati, em 2007Fã de Juan Manuel Fangio e Ayrton Senna, De Filippis foi a primeira das cinco mulheres a disputar corridas de Fórmula 1. Sua breve carreira na categoria pode não ter produzido resultados notáveis, mas, acima de tudo, representou uma quebra de tabus. A próxima mulher que romper os preconceitos que ainda existem por parte de patrocinadores e pessoas responsáveis pelo automobilismo de maneira geral poderá se lembrar de como tudo começou: com uma mulher que passou por cima de tudo isso para realizar seu sonho.

Fontes: Veloce Today (foto), 8W (foto), Crash.net, The Observer.

16 novembro, 2008

O Trampolim do Diabo

Hoje eu não vou escrever muito. E nem vou escrever sobre Fórmula 1 propriamente dita, embora ela tenha se envolvido nisso no final dos anos 40. Vou apenas deixar estes dois links aqui:

Circuito da Gávea: O "Trampolim do Diabo"

Galeria de Fotos: O "Trampolim do Diabo"

"Trampolim do Diabo" era o apelido pelo qual era conhecido o Circuito da Gávea, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Era um circuito de rua altamente desafiador, que passava pelos bairros da Gávea, Leblon (junto ao perigoso canal da Av. Visconde de Albuquerque, onde faleceu Irineu Corrêa em 1936), Vidigal (na bela Avenida Niemeyer, que serpenteia sobre o mar, rente a um costão rochoso), atravessava os morros da Rocinha e Dois Irmãos, e voltando para a Gávea.

O Circuito da Gávea sediou 16 vezes o Grande Prêmio do Brasil entre 1933 e 1954, quando ainda não fazia parte do Campeonato Mundial (ou melhor, quando nem havia um), com com algumas interrupções, e atraiu estrelas internacionais como Hans Stuck (com sua fabulosa Auto Union de motor traseiro), Achille Varzi, Carlo Pintacuda, Emmanuel de Graffenried, Luigi Villoresi, Juan Manuel Fangio, José Froilán Gonzales, Alberto Ascari, e a folclórica Hellé Nice, que causou escândalo e admiração no público carioca, tanto por ser uma mulher a pilotar carros de corrida como por fumar em público; muitas meninas nascidas a partir daquela época foram batizadas Helenice, em homenagem à piloto francesa. Também viu os pioneiros do automobilismo brasileiro mostrando a sua arte, como o Barão de Teffé, Rubem Abrunhosa, Irineu Corrêa, Benedicto Lopes (que é objeto de uma matéria da Folha de São Paulo de hoje) e o tricampeão Chico Landi.

O primeiro link que eu postei é um ótimo texto com os pormenores da história do Grande Prêmio, uma imagem do traçado e resultados, e o segundo é um lindo acervo fotográfico, cobrindo várias edições da prova. O site ainda tem dois vídeos, um sobre a morte de Irineu Corrêa, e este aqui, com imagens do GP de 1937, onde o italiano Carlo Pintacuda, com Alfa Romeo venceu um duelo histórico com Hans Stuck, com Auto Union:



Adooooro isso.

02 novembro, 2008

Na última curva

A temporada de 2008 ainda será discutida por muitos anos. Erros de uns aqui, punições a outros ali (justas? injustas? favorecimento? a quem? e o que importa agora?), e um título decidido na última corrida. Na última corrida não, praticamente na última curva.

O Grande Prêmio do Brasil de 2008, em Interlagos, foi o palco de uma das decisões de título mais apertadas da história. Lewis Hamilton, da McLaren, em seu segundo ano na categoria, liderava com seguros 7 pontos de vantagem. Bastaria um quinto lugar para o inglês garantir o título, independente dos resultados do desafiante Felipe Massa, da Ferrari, vice-líder do campeonato. O brasileiro era o primeiro piloto de seu país a chegar ao final com chances de ser campeão desde 1991, quando Ayrton Senna ficou com o título por antecipação, e isso acendeu a torcida de uma forma que talvez Interlagos nunca tenha visto antes. No grid de largada, Massa tinha a vantagem, largando na pole-position, e contando com a outra Ferrari de Kimi Raikkonen, o campeão do ano anterior, logo atrás, na terceira posição, ao lado de Hamilton, o quarto.

Com os carros alinhados no grid, faltando cerca de 10 minutos para a volta de apresentação, desaba uma chuva rápida, mas pesada o suficiente para a direção de prova suspender o procedimento de largada por mais 10 minutos e cogitar uma largada em movimento atrás do safety car. Não foi necessário. Mas mesmo assim, a balança, tão sensível, pendeu um pouco para Hamilton, já que a Ferrari tinha muitas dificuldades em obter um aquecimento ideal dos pneus em pista molhada, ao contrário da McLaren. Na largada, todos foram conservadores. Os cinco primeiros mantiveram suas colocações na primeira curva, embora Hamilton tenha perdido um pouco de tração e seu companheiro de equipe, Heikki Kovalainen, optado por não disputar o quarto posto com o inglês. Uma rodada de David Coulthard, da Red Bull no S do Senna provocou a entrada do safety car ainda na primeira volta. Foi a última participação do escocês vice-campeão mundial de 2001.

A chuva, contudo, já havia parado, e a maior parte da pista estava seca. Na terceira volta Giancarlo Fisichella, da nanica Force India, parou nos boxes e calçou compostos para pista seca. Quando a corrida foi reiniciada, ficou logo claro que a pista estava seca demais para os pneus intermediários, e algumas voltas depois todos os pilotos trocaram os pneus. Fisichella, havia algumas voltas em ritmo de pista seca, apareceu surpreendentemente em quinto, e se sustentou à frente de Hamilton por um bom tempo.

Lewis Hamilton havia perdido posições para Fernando Alonso e Sebastian Vettel, e ficou a primeira parte da corrida em sexto, abaixo do necessário para garantir o título mundial. Mas Vettel corria leve, e foi o primeiro a reabastecer, voltando na sexta colocação. Jarno Trulli, da Toyota, que surpreendera largando em segundo, teve problemas em manter o ritmo após o pit stop e caiu rapidamente. Hamilton passou a andar em quarto, apenas preocupado com a diferença para Kimi Raikkonen à sua frente, e Timo Glock, na sua perseguição. Massa e Alonso corriam sozinhos nas duas primeiras colocações, e a performance do brasileiro dava a impressão de que conseguiria fazer o que era necessário para garantir o título. Todos se perguntavam o que aconteceria com Hamilton.

Após o reabastecimento de todos, Massa voltou na liderança, com Vettel novamente em segundo, e em grande forma, com Alonso em terceiro, Raikkonen em quarto, Hamilton em quinto, seguido de longe por Glock. Novamente, Hamilton tinha a balança pendendo para o seu lado. A situação melhorou para o inglês quando Kovalainen assumiu o sexto posto, começando a atuar como escudeiro. Novamente Vettel (que continuava leve, e correndo como se estivesse numa Ferrari) teve que reabastecer. A equipe apostara em chuva durante a corrida, mas ela não veio. Massa agora liderava com certa folga, e Hamilton era o quarto.

Porém, poucos minutos depois a sorte parecia mudar. O céu enegreceu, e a oito voltas do fim, começou a chover novamente. Kovalainen foi um dos primeiros a parar para trocar os pneus, e com isso Hamilton perdeu seu escudeiro. Nas duas voltas seguintes, praticamente todos os pilotos fizeram pit stops para troca de pneus, exceto Timo Glock, que assumiu a quarta posição. Após esta rodada de pits, Massa liderava ainda com folga, Alonso era o segundo em mais um desempenho sólido do espanhol e da Renault, Raikkonen o terceiro, se aproximando do espanhol, seguido da Toyota de Glock, Hamilton e Vettel.

Mais uma vez, o alemão da Toro Rosso correu como um possuído na chuva, e o que parecia improvável aconteceu a três voltas do fim: se aproveitando de uma manobra de Robert Kubica (retardatário, mas no momento vinha mais veloz que os dois) ultrapassando Vettel e Hamilton, o alemão deixou a McLaren para trás. Hamilton, até então adotando uma atitude conservadora e paciente, precisou arriscar, balançar o carro a cada curva para tentar recuperar a posição - e o campeonato. A arquibancada incrédula e extasiada gritava com essa reviravolta nos últimos momentos, e nos boxes da Ferrari todos comemoravam como doidos.

As duas últimas voltas foram de muita luta vã por parte de Hamilton, que não tinha o carro tão equilibrado na chuva como em outras ocasiões, e não conseguia se aproximar de Vettel. Felipe Massa já tinha meia volta de vantagem, e não perderia aquela corrida, que dominou de forma soberba como nos anos anteriores em que esteve lá com Ferrari. Ele recebeu a bandeirada em primeiro. Interlagos quase veio abaixo, esperando apenas a confirmação do sexto lugar de Hamilton e do título do brasileiro.

Mas Glock, com pneus para pista seca, que, de início, o fez mais rápido que os concorrentes com pneus intermediários, não conseguiu sustentar o seu ritmo naquelas condições de pista. E, fazendo uma última volta lenta, como se patinasse no gelo, não pôde evitar a dupla ultrapassagem de Vettel e Hamilton na Curva da Junção, que leva ao setor da reta dos boxes (ainda havia a Curva do Café, mas aquilo é curva? :^P). A Ferrari ainda celebrava o título momentos depois de Lewis Hamilton cruzar a linha de chegada em quinto e se tornar o mais novo campeão mundial de Fórmula 1.

Monocromático falando do presente? É porque esta corrida já é História.