11 agosto, 2007

Momento Crítico 2: Um Spray de Pimenta

Bertrand Gachot em sua melhor prova, o GP da Hungria de 1991, onde marcou a melhor voltaDepois de tecer minha visão sobre a importância da decisão de um piloto mediano, Derek Warwick, no desenrolar dos fatos da Fórmula 1 nos anos 80, ao recusar uma proposta da Williams para 1985, apresento outro momento crucial da história recente da categoria, novamente protagonizada por um piloto que pouco fez dentro das pistas para ser lembrado. Aliás, foi um incidente curioso - e lamentável - fora delas que levou seu nome à eternidade. É o "causo" de Bertrand Gachot.

Nem é preciso ser tão rápido para associar Gachot à carreira de Michael Schumacher. Quem acompanhou a carreira do alemão conhece a história da sua estréia na Fórmula 1, e eu não tenho o que acrescentar. Mas vale a pena relembrar.

Em 1991 Gachot conseguiu uma vaga na estreante equipe Jordan, ao lado do cigano Andrea de Cesaris. A equipe era nova, a dupla já não era das mais promissoras - o próprio Gachot já havia amargado duas temporadas péssimas com Onyx, Rial e Coloni, e de Cesaris já tinha má reputação como destruidor de carros. Mas no final, o chassis projetado por Gary Anderson, e o motor Ford-Cosworth V8 de primeira linha tornaram o carro bastante competitivo, e ambos os pilotos disputavam as posições de pontuação com freqüência.

Duas semanas antes do GP da Bélgica daquele ano, Gachot, que havia registrado 4 pontos no campeonato, fez a melhor volta do GP da Hungria. As expectativas para o GP belga eram grandes (e realmente, antecipando a história, Andrea de Cesaris poderia ter disputado a vitória na Bélgica se não fosse um problema no final da corrida quando estava em segundo!).

Mas eis que nos dias entre os GPs, Gachot se envolveu numa discussão com um taxista em Londres. O belga sacou um spray de pimenta e o espirrou nos olhos do motorista. Não importa se foi por legítima defesa ou não: sprays de pimenta eram proibidos na Inglaterra. Gachot foi detido. Curioso foi um protesto organizado pelos compatriotas Thierry Boutsen e Eric van de Poele depois em frente ao consulado britânico em Bruxelas pedindo a libertação do colega. Mas ele não seria libertado até outubro...

Michael Schumacher em ação em Spa-FrancorchampsEddie Jordan agiu com rapidez e firmou um contrato informal com o jovem piloto da Mercedes, Michael Schumacher, para disputar as corridas em que seu piloto estivesse indisponível. Antes do primeiro treino, Schumacher deu uma volta de bicicleta para ver as condições do circuito (a lenda diz que foi sua primeira vez em Spa-Francorchamps, mas na verdade ele já havia disputado provas lá antes). No sábado, o alemão cravou o sétimo tempo, quatro posições à frente de de Cesaris. Na largada, travou pneus para ultrapassar Nelson Piquet e Jean Alesi, mas a ousadia do estreante ficou depois da Eau Rouge, ainda na primeira volta, quando o motor estourou.

O que aconteceu depois é História com H maiúsculo. Roberto Pupo Moreno foi demitido da Benetton nos dias seguintes com desculpas esfarrapadas, Flavio Briatore contratou o alemão, e dali ele partiu para se tornar "O Schumacher". Mas vejam como a linha do tempo é tênue, delicada: mais uma vez, os acontecimentos com um indivíduo de pouca importância na categoria, que poderia nem ter terminado a temporada na equipe, visto que depois de ser libertado a vaga estava preenchida por Alessandro Zanardi, determinaram todo o futuro do esporte pelos 16 anos seguintes, e que ainda ecoam até hoje. Se Gachot tivesse resolvido seu problema com o taxista londrino civilizadamente, e Schumacher tivesse estreado em outro momento (o que também parecia inevitável), em outra pista, em outro carro, e impressionado menos, teria tido ele as mesmas oportunidades que teve? Ninguém pode responder. Mas assim funciona o universo: cada acontecimento insignificante envia ecos que reverberam nas vidas de todos. Uma lição para sermos mais responsáveis com nossas atitudes, quem sabe o que pode acontecer...

Fontes: Formula One Facts (fotos), e agradecimentos ao leitor André Nascimento por lembrar o "delinqüente" Gachot. Ainda vou escrever mais sobre o assunto que ele propôs.

7 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns pelo Blog. Encontrei-o na semana passada por acaso e gostei tanto que já devorei todos os artigos. Gostei muito da idéia da trilogia da geração perdida. Como leitor daria outra sugestão, tal como lançar luz a uma outra geração igualmente perdida; a dos anos 90, cujos bons pilotos foram ofuscados pela presença hegemônica de Michael Schumacher (para o bem e para o mal, na minha opinião).

Enfim, fico por aqui ansioso por novos e bons artigos como os que já li.

Abraços.

Blog F1 Grand Prix disse...

O alemão tinha estrela mesmo. Que situação mais estranha precisou acontecer para que ele estreasse...

Bertrand Gachot e o taxista não sabiam que mudaram a história do esporte no dia em que brigaram em Londres.

Belo texto, valeu!

Grande abraço!

Anônimo disse...

Conheço essa história..realmente não há campeão sem sorte.

Dá uma olhadela no meu blog:

www.mundo-rolamentos.blogspot.com

Grande Abraço

Anônimo disse...

Legal este blog, vc. está de parabéns, continue a desenvolver as suas narrativas assim como estão, pois são ótimas. Um abraço

Schuey2007 disse...

Optimo blog, descobri-o ontem e redescobri-o hoje. Muito bom mesmo

Grande Abraço

Fabio disse...

Olha, embora tenha receio de divulgar meu ainda nascituro blog isso msm), como coloquei um link do Histórias da F1 lah me senti responsável em te comunicar.

Resta mesmo é meus parabéns e agradecer pelas belíssimas histórias. Destaco a do Conde de Dumfries... só a F1...

Abraço

Anônimo disse...

Conheci o Gachot por meio de um trabalho que fazia com um patrocinador da equipe Pacific em 1995 e devo dizer com toda firmeza, que esse cara é um estourado de duas caras. Não sobrou uma grama de simpatia pelo belga.