Mostrando postagens com marcador Alan Jones. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Alan Jones. Mostrar todas as postagens

08 agosto, 2008

A Guerra das Placas

Lole contra JonesPor causa de frustrações acadêmicas, não tenho pensado muito sobre Fórmula 1. Mas, por sorte, algum troll fez aparecer na comunidade F1 Brasil do orkut um texto que escrevi em 2006, e do qual eu já tinha até esquecido. Este é para quem odeia a Ferrari por ter "inventado" o "jogo de equipe" durante a era Schumacher. A história a seguir não envolve a equipe de Maranello, e se passa bem mais no passado, a partir do GP do Brasil de 1981:

Keke Rosberg briga entre os grandes com sua Fittipaldi no GP do Brasil em 1981Quando os carros alinharam no grid para a largada em Jacarepaguá, núvens negras assomavam nas montanhas a oeste, como é típico do prenúncio de temporais na região da Baixada de Jacarepaguá (morei do outro lado da lagoa, olhando para essas mesmas montanhas por 19 anos), anunciando um verdadeiro pé d'água. Foi o que ocorreu. Mesmo assim, vários pilotos, inclusive o nativo Nélson Piquet, apostaram que a chuva passaria ao largo do circuito e optaram por pneus slick. Um engano desastroso. Na largada Chico Serra, com sua Fittipaldi, René Arnoux de Renault e Mario Andretti de Alfa Romeo fizeram um tremendo estrago na pista. A corrida prosseguiu com as duas Williams passeando à frente da Arrows de Patrese, enquanto os reais adversários lutavam para manter seus carros no traçado (em certo momento, Keke Rosberg, um ás em pista molhada com a outra Fittipaldi esteve na quinta posição!).

Torcedores argentinos provocam Alan Jones na ArgentinaAlan Jones pilotava a Williams número 1, mas quem liderava era Carlos Reutemann com o carro branco número 2. Jones iniciava sua defesa de título, e todos, inclusive a equipe, esperavam que o argentino cooperasse na empreitada. Já perto do final da prova (que terminou no limite de 2 horas), Jones vinha 2 segundos atrás de Reutemann, quando a Williams mostrou a placa "JONES-REUT", indicando que o argentino deveria deixar o piloto número 1 passar. Mas isso não aconteceu, e Carlos Reutemann, contrariando equipe e companheiro de equipe, venceu a corrida. A partir de então, o australiano nutriria um ódio por seu colega que duraria até o final de suas carreiras - e, francamente, nem sei se eles fizeram as pazes um dia.

Duas semanas depois veio o Grande Prêmio da Argentina, em Buenos Aires. A torcida compareceu em peso, empolgada pela vitória de seu maior piloto depois de Juan Manuel Fangio. Alan Jones foi multado em 500 dólares por ter dado três voltas a mais do que o permitido em um dos treinos. Jones e Frank Williams respondem à provocaçãoAlguém ironizou: "Se Reutemann não enxergou uma placa mostrada a ele por cinco vezes no Brasil, ele pode bem não ter visto uma bandeira mostrada a ele por três vezes..."

Ainda nos treinos, alguém na arquibancada compôs uma placa onde se lia "REUT-JONES". Percebendo a provocação, o irônico Alan Jones, com ajuda de Frank Williams, exibiu outra nos boxes escrito "JONES-REUT". A arquibancada quase veio abaixo, e a torcida pareceu que invadiria a pista. No dia da corrida centenas de placas, papéis, e faixas surgiram com a inscrição "REUT-JONES". As outras equipes participaram da batalha, produzindo suas próprias placas.

Reutemann com a galeraNa corrida, Jones pulou na ponta mas foi logo superado pelo pole Nélson Piquet. Lole, em terceiro, perseguiu Jones, e, para delírio dos fãs, o argentinou conseguiu a ultrapassagem para terminar em segundo e assegurar a liderança do campeonato, deixando Alan Jones (em quarto, ultrapassado por Alain Prost, que obteve seu primeiro pódio na categoria) mais uma vez emburrado ao final da prova enquanto a torcida agitava suas bandeiras e seus cartazes "REUT-JONES".

Fonte: F1 Web - Argentina (incluindo fotos... preciso ressaltar que é uma página fantástica), Formula One Facts. Escrevi o texto há tanto tempo que não me lembro das outras fontes que usei.

13 setembro, 2007

O pai de Alan Jones

Alan Jones, o australiano campeão do mundo de 1980 pela Williams, vivia dizendo que se seu pai tivesse saúde e disputado o Campeonato Mundial de Fórmula 1, Jack Brabham não teria ganho nada. Embora muitas das declarações de Jones tenham sido feitas no calor da discussão - a imprensa era implacável com ele, e ele reagia ao melhor estilo Nelson Piquet - talvez haja um fundo de verdade no que diz sobre seu pai.

Capa do programa do GP da Nova Zelândia de 1956, mostrando Stan Jones, o vencedor do ano anteriorStan Jones foi o primeiro piloto australiano a conseguir sucesso internacional, num tempo em que a Fórmula 1 não se restringia ao Campeonato Mundial, e haviam dezenas de corridas importantes extra-campeonato mundo afora, inclusive alguns campeonatos nacionais, como já mencionei no post anterior. Da mesma geração que Sir Jack Brabham, tornou-se nos anos 40 um dos ídolos do esporte australiano. Em 1955, ao vencer o primeiro Grande Prêmio da Nova Zelândia - corrida de Fórmula 1 extra-campeonato que se tornaria das mais importantes nos anos seguintes - Stan, pilotando um carro de fabricação local (um Mayback Special, com motor próprio de 6 cilindros) tornou-se o primeiro australiano a vencer em um evento internacional. Naquela prova, Jack Brabham foi o sexto.

Stan Jones com seu MaybachA chegada dos contrutores europeus, como Maserati, Ferrari, Cooper (que já aparecia nas mãos de Brabham), Connaught e Bugatti tornou a competição mais acirrada nos anos seguintes, e os pilotos locais correndo com carros fabricados na Austrália e Nova Zelândia, incluindo o Mayback de Jones, começaram a ficar para trás. Em 55 e 56 os resultados nas principais provas foram fracos. Enquanto Stan procurava o domínio das corridas regionais, Brabham já estava na Europa, conquistando resultados expressivos, o que aumentou o interesse dos europeus pelas corridas da Oceania. O GP neozelandês de 55, por exemplo, foi vencido pelo Príncipe Bira e em 56 por Stirling Moss. Brabham, Reg Parnell, Louis Chiron, Denny Hulme, e o adolescente Bruce McLaren também figuravam entre participantes das corridas de Fórmula 1 locais.

O Maserati 250F, restaurado, usado por Stan JonesMas todos queriam ver Stan Jones brilhar. Quando seu novo carro, uma Maserati 250F (o carro preferido das equipes privadas no Campeonato Mundial) chegou da Europa, Jones desfilou em exibição em Geelong Sprints - uma competição de estrada que existe até hoje, mas como campeonato de arrancadas. Mais tarde, naquele ano, venceu o Grande Prêmio de estrada de Nova Gales do Sul. Mais tarde, disputou o Grande Prêmio da Austrália, em Albert Park (isso mesmo!) contra pilotos como Moss e Jean Behra, ambos da equipe oficial da Maserati. Moss foi o vencedor e Stan Jones foi o quinto.

Vencer o GP da Austrália se tornou uma obcessão. Em 57 Stan Jones andou sempre entre os favoritos em todas as provas regionais. Após um terceiro na Nova Zelândia, atrás de duas Ferrari, chegou em segundo lugar no GP australiano em Cavershan. Durante a prova, enquanto liderava, Jones passou mal e teve que ir aos boxes tomar água. Durante a parada, Lex Davidson, com Ferrari, tomou a ponta, mas a equipe pensou que o rival apenas havia descontado uma volta de atraso, e Jones pilotou até o fim pensando estar na liderança. Quando recebeu a bandeirada, foi aclamado vencedor - o que seria sua maior conquista na carreira - até que a equipe de Davidson pediu para a direção de prova confirmar o lap chart. Ainda naquele ano saiu praticamente ileso de um acidente em Southport, onde seu carro foi dividido ao meio.

Stan controla sua Maserati no GP da Nova Zelândia de 57Em 58 Stan Jones conquistou o prêmio Gold Star - o equivalente na época ao Campeonato Australiano de Fórmula 1 - como melhor piloto nas corridas australianas. Porém mais uma vez o Grande Prêmio da Austrália lhe escapou por um triz - dominava completamente a corrida quando o carro quebrou, a 4 voltas do fim.

Em 59, Jones tentou mais uma vez o GP australiano, desta vez disputado na Tasmânia. Tinha como maiores concorrentes as novas Cooper de motor traseiro e freios a disco, que revolucionavam a Fórmula 1 na Europa e faziam de Jack Brabham o homem a ser batido por lá. Mas mesmo a agilidade do bólido inglês - e vários toques de roda pelo caminho - não foi capaz de bater Stan e sua velha Maserati. A crônica da época dizia que "finalmente Jones pôde ter de volta um pouco do que ele tem dado há tanto tempo ao automobilismo australiano". Durante o ano, Stan vendeu sua Maserati e comprou uma Cooper, com a qual terminou o GP da Nova Zelândia em quarto, atrás de Brabham e McLaren (ambos com o mesmo carro, mas motores mais potentes), mas muito à frente de Hulme.

Stan Jones não estava fadado a ter um final feliz. Durante 1960, divorciado, problemas financeiros o fizeram perder seus negócios, e seu filho Alan, com 14 anos, começou a ter que se virar sozinho para sustentar a casa e seguir carreira no automobilismo. Ainda naquele ano, Stan sofreu dois derrames e nunca mais correu profissionalmente. Ele morreu de infarto em 73, enquanto o filho corria na Fórmula 3 britânica.

Stan Jones ajoelhado ao lado de seu Maybach 2 de 1955Alan Jones, depois de muita luta, conseguiu sucesso na Europa, enquanto o automobilismo australiano se afastava do centro das atenções. Porém, enquanto era criança, vendo seu pai se tornar um ídolo nacional ao pilotar com bravura contra estrelas internacionais em carros de ponta, a impressão que tivera com certeza justifica sua declaração lá no primeiro parágrafo. Pois não apenas seu pai foi o herói do garoto, como muitos pais são heróis de seus filhos by default, como foi a inspiração para sua carreira. É possível que, na Europa, Stan tivesse tido uma carreira obscura e nunca tivesse superado Brabham - como às vezes acontecia quando corriam um contra o outro - mas é igualmente possível que Brabham nunca tivesse obtido o mesmo sucesso se seu rival estivesse em seus calcanhares. Ou talvez ambos chegassem a níveis jamais sonhados. Se Jones estava certo sobre seu pai ser melhor que Brabham, logo, não dá para dizer. Mas sei que foi o Sr. Jones quem fez, biológica e psicologicamente, um campeão mundial.

Fontes: Sports Car Market Magazine, F1 Total, Aussie Road Racing, New Zealand Grand Prix