Mostrando postagens com marcador Cooper. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Cooper. Mostrar todas as postagens

13 julho, 2008

Os pequenos mexicanos

Para quem acompanha o automobilismo há coisa de 10 anos, pode soar estranho falar sobre o México e desvincular seus pilotos do automobilismo norte-americano. Na Fórmula 1, o último piloto mexicano foi Hector Rebaque (corrigindo o post original), no início da década de 1980, de pouca expressão na história da categoria.

Mas existe um monumento nos arredores da cidade do México que lembra ao mundo, com seu próprio nome, que o automobilismo mexicano já foi proeminente na Fórmula 1, o Autódromo Hermanos Rodriguez, batizado em homenagem aos irmãos Ricardo e Pedro Rodriguez, os alvos deste texto.

Pedro e Ricardo Rodriguez de la Vega eram filhos de Pedro Natalio, um rico empresário (e acrobata de motos!) que impulsionou o gosto dos filhos pela velocidade. De início, tanto Pedro como Ricardo competiram em campeonatos nacionais de moticiclismo e venceram torneios nos anos 50. Em 1957, com 17 anos, Pedro já participava de competições internacionais de protótipos. Em 58 Pedro, com 20 anos, tentou inscrever-se em dupla com o irmão para as 24 Horas de LeMans, mas Ricardo, com 18 anos incompletos, foi vetado pela idade. Pedro participaria da prova daquele ano com José Behra, irmão do piloto de Fórmula 1 Jean Behra, e voltaria a LeMans mais 14 vezes, vencendo a prova em 1968, dividindo um Ford GT 40 com Lucien Bianchi. Em 1959, correndo contra o irmão, Pedro venceu a primeira corrida disputada no circuito de Magdalena-Mixhuca - que seria conhecido posteriormente como Hermanos Rodriguez.

Ricardo Rodriguez em sua Ferrari 156, em sua estréia em Monza, 1961Ricardo, de apenas 19 anos, era considerado uma das grandes promessas do automobilismo latino-americano pelo seu extremo arrojo, estreando no Campeonato Mundial como convidado em Monza, 1961, com uma Ferrari. Correndo com um antiquado motor com angulação de 65° contra motores de 120°, largou em segundo, perdendo a pole position para Wolfgang von Trips por um décimo de segundo, e registoru a quarta melhor volta - 33 pilotos formaram excepcionalmente o grid, e von Trips faleceria durante a prova.

Em 1962, Ricardo fazia uma temporada razoável com a Ferrari, obtendo 4 pontos no Mundial (foi o piloto mais jovem a pontuar na categoria até 2000, quando Jenson Button marcou seu primeiro ponto no GP do Brasil), além de vitórias em provas de marcas (venceu a Targa Florio e os 1000km de Paris, ao lado do irmão mais velho). Em Monza, largou em décimo primeiro num grid de 22 lugares disputado por 31 carros, à frente de seus companheiros de equipe Lorenzo Bandini, Giancarlo Baghetti, e do campeão do ano anterior, Phil Hill. O fiasco do GP italiano fez a Ferrari se retirar do campeonato nas corridas seguintes, na América do Norte. O Grande Prêmio do México, ainda uma corrida extra-campeonato, atrairia a atenção de muitos pilotos (Jim Clark, Jack Brabham, John Surtees, Dan Gurney, e vários outros grandes nomes) e escuderias européias por ter seu lugar garantido no mundial do ano seguinte. Sem a Ferrari para disputar a prova, Ricardo assinou com a equipe Walker-Lotus. Porém, no primeiro dia do evento, Ricardo sofreu um acidente na curva Peraltada que lhe tirou a vida. O México caiu em luto.

Pedro RodriguezEnquanto isso, Pedro dedicava-se a várias categorias diferentes, obtendo sucesso em todas elas. Pedro pensou em desistir de correr após a morte de Ricardo, que ele assitiu no próprio autódromo. Mas retornou em 1963 em sua melhor forma, vencendo os 1000km de Daytona, com uma Ferrari 250 GTO, ao lado de Phil Hill. Outras boas apresentações renderam um convite da Lotus para participar dos GPs dos Estados Unidos e México (agora parte do Campeonato Mundial). Pedro continuaria divindo, nos anos seguintes, seu tempo entre várias categorias de monopostos, turismo e protótipos, e participaria apenas de algumas provas do Mundial de Fórmula 1 com Ferrari (graças aos bons resultados em provas de protótipos pela escuderia) e Lotus.

Pedro Rodriguez no GP da África do Sul de 1967Ao final de 1966 Pedro assinou contrato para a temporada inteira de 1967 pela equipe Cooper. E logo na prova de estréia - sua nona na categoria, o intenso GP da África do Sul, em Kyalami, o velho modelo T81 de Rodriguez sobreviveu ao intenso calor e o conduziu à sua primeira vitória. Embora a Cooper já estivesse numa espiral descendente (esta seria sua última vitória), Pedro ainda deu um toque de qualidade ao time, marcando pontos em várias provas, superando os Ferrari, BRM e Eagle. Apesar de um acidente numa prova de Fórmula 2 tê-lo deixado de fora em três corridas do mundial, o mexicano terminou o campeonato em sexto lugar - à frente do piloto número 1 da equipe, Jochen Rindt.

Pedro e Bianchi posam como vencedores das 24 Horas de LeMansEm 68 assinou com a BRM, e embora o modelo P133 não estivesse à altura de Lotus, McLaren e Matra, Pedro conquistou três pódios e uma melhor volta, terminando novamente o mundial em sexto, além da conquista em LeMans.

Apesar de natural da Cidade do México, uma região de clima semi-árido, a especialidade de Pedro eram as pistas escorregadias. Destacou-se em inúmeras corridas de marcas com chuva, e o pódio no GP da Holanda de 1968 e a melhor volta do GP da França no mesmo ano foram sob chuva. Em 1970 participou de um campeonato de corridas no gelo, no Alaska, sagrando-se campeão de sua categoria. Pedro era um dos pilotos mais seguros e completos de sua época, em contraste com seu irmão mais novo que, segundo Nélson Piquet, era o mais corajoso que já correu - e o mais temerário.

Pedro Rodriguez pilota o Porsche 917K para a vitória em Watkins Glen, 1970Em 69 Pedro dividiu seu tempo entre Fórmula 1 (correndo por três equipes diferentes), marcas, NASCAR, rally e Can-Am, voltando a ocupar um lugar fixo na Fórmula 1 em 70, pela BRM, ao mesmo tempo que correria o Mundial de Marcas pela Porsche (obtendo 4 vitórias). No GP da Bélgica, Rodriguez venceu pela segunda vez, aproveitando-se das quebras de Rindt (ainda nos treinos), Jackie Stewart e Jack Brabham, e após um longo e duro duelo com a March de Chris Amon. Foi a última vitória dos pneus Dunlop na categoria. Com mais um pódio em Watkins Glen, Pedro terminou o campeonato em sétimo lugar.

Rodriguez conduz sua BRM para o segundo lugar no GP da Holanda de 19711971 começou bem para o mexicano, com mais 4 vitórias no Mundial de Marcas pela Porsche e mais um ano garantido na BRM, que mudara de comando mas continuava moderadamente competitiva. Um segundo na chuva em Zandvoort mostrava que Rodriguez poderia surpreender mais uma vez. Mas enquanto participava de uma prova de carros esporte no circuito alemão de Norisring, Nuremberg, com uma Ferrari 512M, sofreu um acidente fatal, aos 31 anos.

Assim, os irmãos Rodriguez terminavam sua história, e o México seria negligenciado ao segundo plano pela Fórmula 1 até 1992, quando o Grande Prêmio do México, disputado no antigo Autódromo de Magdalena-Mixhuca, rebatizado em honra aos irmãos Rodriguez, foi disputado pela última vez. Ricardo morreu numa idade em que muitos grandes pilotos ainda despontam para o automobilismo mundial, e poderia ter se tornado um deles. Pedro provou ser um dos pilotos mais versáteis da história do automobilismo, e estava no seu auge quando a morte sobreveio em Norisring. O primeiro hairpin do traçado misto de Daytona recebeu seu nome, e uma placa de bronze marca o local de sua morte em Nuremberg.

Fontes: http://www.imca-slotracing.com, Faster - Encyclopedia, Formula One Facts, , Wikipedia (espanhol), 8W, Fangio - Un tributo al chueco

13 setembro, 2007

O pai de Alan Jones

Alan Jones, o australiano campeão do mundo de 1980 pela Williams, vivia dizendo que se seu pai tivesse saúde e disputado o Campeonato Mundial de Fórmula 1, Jack Brabham não teria ganho nada. Embora muitas das declarações de Jones tenham sido feitas no calor da discussão - a imprensa era implacável com ele, e ele reagia ao melhor estilo Nelson Piquet - talvez haja um fundo de verdade no que diz sobre seu pai.

Capa do programa do GP da Nova Zelândia de 1956, mostrando Stan Jones, o vencedor do ano anteriorStan Jones foi o primeiro piloto australiano a conseguir sucesso internacional, num tempo em que a Fórmula 1 não se restringia ao Campeonato Mundial, e haviam dezenas de corridas importantes extra-campeonato mundo afora, inclusive alguns campeonatos nacionais, como já mencionei no post anterior. Da mesma geração que Sir Jack Brabham, tornou-se nos anos 40 um dos ídolos do esporte australiano. Em 1955, ao vencer o primeiro Grande Prêmio da Nova Zelândia - corrida de Fórmula 1 extra-campeonato que se tornaria das mais importantes nos anos seguintes - Stan, pilotando um carro de fabricação local (um Mayback Special, com motor próprio de 6 cilindros) tornou-se o primeiro australiano a vencer em um evento internacional. Naquela prova, Jack Brabham foi o sexto.

Stan Jones com seu MaybachA chegada dos contrutores europeus, como Maserati, Ferrari, Cooper (que já aparecia nas mãos de Brabham), Connaught e Bugatti tornou a competição mais acirrada nos anos seguintes, e os pilotos locais correndo com carros fabricados na Austrália e Nova Zelândia, incluindo o Mayback de Jones, começaram a ficar para trás. Em 55 e 56 os resultados nas principais provas foram fracos. Enquanto Stan procurava o domínio das corridas regionais, Brabham já estava na Europa, conquistando resultados expressivos, o que aumentou o interesse dos europeus pelas corridas da Oceania. O GP neozelandês de 55, por exemplo, foi vencido pelo Príncipe Bira e em 56 por Stirling Moss. Brabham, Reg Parnell, Louis Chiron, Denny Hulme, e o adolescente Bruce McLaren também figuravam entre participantes das corridas de Fórmula 1 locais.

O Maserati 250F, restaurado, usado por Stan JonesMas todos queriam ver Stan Jones brilhar. Quando seu novo carro, uma Maserati 250F (o carro preferido das equipes privadas no Campeonato Mundial) chegou da Europa, Jones desfilou em exibição em Geelong Sprints - uma competição de estrada que existe até hoje, mas como campeonato de arrancadas. Mais tarde, naquele ano, venceu o Grande Prêmio de estrada de Nova Gales do Sul. Mais tarde, disputou o Grande Prêmio da Austrália, em Albert Park (isso mesmo!) contra pilotos como Moss e Jean Behra, ambos da equipe oficial da Maserati. Moss foi o vencedor e Stan Jones foi o quinto.

Vencer o GP da Austrália se tornou uma obcessão. Em 57 Stan Jones andou sempre entre os favoritos em todas as provas regionais. Após um terceiro na Nova Zelândia, atrás de duas Ferrari, chegou em segundo lugar no GP australiano em Cavershan. Durante a prova, enquanto liderava, Jones passou mal e teve que ir aos boxes tomar água. Durante a parada, Lex Davidson, com Ferrari, tomou a ponta, mas a equipe pensou que o rival apenas havia descontado uma volta de atraso, e Jones pilotou até o fim pensando estar na liderança. Quando recebeu a bandeirada, foi aclamado vencedor - o que seria sua maior conquista na carreira - até que a equipe de Davidson pediu para a direção de prova confirmar o lap chart. Ainda naquele ano saiu praticamente ileso de um acidente em Southport, onde seu carro foi dividido ao meio.

Stan controla sua Maserati no GP da Nova Zelândia de 57Em 58 Stan Jones conquistou o prêmio Gold Star - o equivalente na época ao Campeonato Australiano de Fórmula 1 - como melhor piloto nas corridas australianas. Porém mais uma vez o Grande Prêmio da Austrália lhe escapou por um triz - dominava completamente a corrida quando o carro quebrou, a 4 voltas do fim.

Em 59, Jones tentou mais uma vez o GP australiano, desta vez disputado na Tasmânia. Tinha como maiores concorrentes as novas Cooper de motor traseiro e freios a disco, que revolucionavam a Fórmula 1 na Europa e faziam de Jack Brabham o homem a ser batido por lá. Mas mesmo a agilidade do bólido inglês - e vários toques de roda pelo caminho - não foi capaz de bater Stan e sua velha Maserati. A crônica da época dizia que "finalmente Jones pôde ter de volta um pouco do que ele tem dado há tanto tempo ao automobilismo australiano". Durante o ano, Stan vendeu sua Maserati e comprou uma Cooper, com a qual terminou o GP da Nova Zelândia em quarto, atrás de Brabham e McLaren (ambos com o mesmo carro, mas motores mais potentes), mas muito à frente de Hulme.

Stan Jones não estava fadado a ter um final feliz. Durante 1960, divorciado, problemas financeiros o fizeram perder seus negócios, e seu filho Alan, com 14 anos, começou a ter que se virar sozinho para sustentar a casa e seguir carreira no automobilismo. Ainda naquele ano, Stan sofreu dois derrames e nunca mais correu profissionalmente. Ele morreu de infarto em 73, enquanto o filho corria na Fórmula 3 britânica.

Stan Jones ajoelhado ao lado de seu Maybach 2 de 1955Alan Jones, depois de muita luta, conseguiu sucesso na Europa, enquanto o automobilismo australiano se afastava do centro das atenções. Porém, enquanto era criança, vendo seu pai se tornar um ídolo nacional ao pilotar com bravura contra estrelas internacionais em carros de ponta, a impressão que tivera com certeza justifica sua declaração lá no primeiro parágrafo. Pois não apenas seu pai foi o herói do garoto, como muitos pais são heróis de seus filhos by default, como foi a inspiração para sua carreira. É possível que, na Europa, Stan tivesse tido uma carreira obscura e nunca tivesse superado Brabham - como às vezes acontecia quando corriam um contra o outro - mas é igualmente possível que Brabham nunca tivesse obtido o mesmo sucesso se seu rival estivesse em seus calcanhares. Ou talvez ambos chegassem a níveis jamais sonhados. Se Jones estava certo sobre seu pai ser melhor que Brabham, logo, não dá para dizer. Mas sei que foi o Sr. Jones quem fez, biológica e psicologicamente, um campeão mundial.

Fontes: Sports Car Market Magazine, F1 Total, Aussie Road Racing, New Zealand Grand Prix

11 setembro, 2007

Um dia de herói

John LoveO Gp de Kyalami de 1967 foi curioso. Primeiro fim de semana do ano, em pleno verão sul-africano. Muitas equipes nem sequer tinham prontos seus equipamentos para aquela temporada. Lotus, Brabham, BRM e Eagle chegaram com seus carros da temporada anterior. A Ferrari nem se deu ao trabalho de ir para lá. A Cooper chegou com seu T81-Maserati, que, desses todos, seria o chassis de 66 que mais tempo continuaria em uso, até o lançamento do T86 no meio da temporada. Várias equipes privadas, também usando equipamentos, ultrapassados preenchiam o grid de largada. Uma dessas equipes é a de John Love. E usando um Cooper T79, defasado em dois anos, e um motor Climax de apenas 4 cilindros! Esse T79 jamais havia disputado um Grande Prêmio antes, era apenas um modelo projetado para Bruce McLaren disputar o campeonato regional de Fórmula 1 na Oceania (sim, haviam campeonatos regionais e até nacionais de Fórmula 1, e o próprio John Love foi hexacampeão do campeonato sul-africano).

Vários pilotos locais também estavam presentes. Pela Scuderia Scribante, usando um Brabham BT11, os sul-africanos Dave Charlton e Luki Botha. Sam Tingle, do Zimbabwe, apresentou-se com um chassis de fabricação própria. Todos buscando uma oportunidade de brilhar ao lado de astros como Jack Brabham, Graham Hill, e Jim Clark. E John Love.

Love guia um Matra de propriedade sua no GP sul-africano de 1971Love foi um desses pilotos que, conforme era costume antigamente, conseguiam um modelo mais antigo de um chassis usado por uma das equipes que disputavam o mundial de Fórmula 1 e corriam no GP de "casa". Embora Love tenha nascido no Zimbabwe (antiga Rodésia), o Grande Prêmio da África do Sul disputado em Kyalami era o mais próximo que este piloto de origem britânica tinha de uma corrida em casa.

Sem propriamente uma escola de automobilismo no Zimbabwe em que pudesse se desenvolver, Love foi tarde tentar a sorte nos campeonatos ingleses. Em 62 sofreu um acidente em Albi que deixou seqüelas, devido a uma fratura feia num braço, e isso o descartou como aposta no mercado da Fórmula 1. Além disso, naquele ano, já contava 38 anos de idade.

Love também não era inexperiente em Grand Prix. Desde 1962 ele fazia uma única participação por ano, normalmente com um carro extra. Apenas em 64 correu o GP da Itália como piloto oficial da Cooper, substituindo o campeão mundial Phil Hill. A partir de 67, com excessão de 66, correu em todas as etapas realizadas na África do Sul, e se tornou o principal piloto daquela região até o surgimento de Jody Scheckter.

Love até 67 (e depois de 67 também) não havia se destacado em suas tentativas no Campeonato Mundial. E com um time próprio e equipamento deficiente, as coisas não seriam fáceis. Contudo, o conhecimento da pista, do comportamento dos carros na altitude superior a 1500 metros, e, principalmente, do clima do lugar naquela época do ano jogariam a favor do rodesiano.

De fato, a Lotus de Hill, as BRM e as Cooper sofreram demais nos treinos por causa do calor, a ponto de esta última serrar a parte dianteira dos chassis para aumentar a entrada de ar para o radiador, sacrificando a aerodinâmica para preservar o motor. Com todos esses problemas, Jack Brabham foi o pole, e John Love conseguiu um magnífico quinto lugar no grid, logo à frente do campeão mundial John Surtees, com a Honda.

Largada para o GP da África do Sul de 67. John Love sai em quinto, no carro 17Na largada Denny Hulme pulou na frente com a outra Brabham, enquanto Love caía para décimo. No começo da prova, Jackie Stewart teve o motor BRM estourado, e Jochen Rindt e Hill escorregaram no óleo deixado na pista. Jackie Brabham também acabou rodando sozinho, e teve que se superar para alcançar Surtees, agora em segundo. Rindt também voava para recuperar o tempo perdido. Enquanto isso, Pedro Rodriguez, com a outra Cooper, tinha problemas de câmbio e tentava se manter na corrida.

Clark e a segunda BRM de Mike Spence tiveram motores estourados (a Lotus usava o mesmo motor BRM H16 da equipe rival, na ocasião). Pouco depois foi a vez dos motores Maserati de Rindt e Jo Siffert. Enquanto isso, o herói local se mantinha bravamente à frente da Eagle de Dan Gurney, e se aproximando de Surtees para assumir a terceira colocação. Na metade da corrida, o rodesiano tinha à sua frente apenas as duas Brabham. Um problema no motor fez com que Jack Brabham diminuísse o ritmo e perdesse posições. Gurney abandonou com problemas de transmissão, Surtees tinha que andar mais lento para conservar o motor, colocando o problemático Cooper de Rodriguez em terceiro. Love tinha apenas Hulme entre ele e uma improvável vitória. E foi quando Hulme teve problemas nos freios e teve que fazer duas paradas de boxe, perdendo a liderança. O piloto do Zimbabwe era o líder, faltando um quarto de prova a ser completada.

Pedro Rodriguez vence a prova com apenas duas marchasO sonho estava próximo. Apenas um incidente mecânico poderia lhe tirar a vitória. Pela primeira vez um piloto do Zimbabwe venceria um Grande Prêmio e lideraria o campeonato. Mas era bom demais para ser verdade. A 6 voltas do final, um vazamento forçou Love a parar nos boxes para um reabastecimento. Quando voltou à pista, estava meio minuto atrás de Pedro Rodriguez, que, com apenas duas marchas, também fazia uma prova heróica. Love voltou com tudo, marcou sua melhor volta na corrida, mas não teve tempo de alcançar o mexicano, que obteve a última vitória da Cooper. Love foi o segundo, quase uma volta à frente de Surtees. O futuro campeão daquele ano, Hulme, foi o quarto, o inglês Bob Anderson o quinto, e Brabham, o atual campeão, o sexto - e esses foram os únicos que completaram oficialmente a corrida, já que a dupla da Scribante não chegou a completar 90% do percurso.

Love sustenta a pressão de GurneyLove ficou a um nada da consagração total. Seu feito foi lembrado por muitos anos, até que a ascenção de Scheckter criasse novos parâmetros para medir o desempenho dos pilotos do sul da África. Essa relativização jogou o feito heróico de Love no esquecimento. Mas como podemos ver, e espero que possamos também aprender, a comparação entre pilotos, carros, tempos e lugares diferentes não quer dizer muita coisa. E, embora poucos se motivem a vasculhar nos arquivos do tempo, o que John Love realizou naquele dia foi algo incomparável.

Fontes: Wikipedia, Formula One Rejects, Formula One Facts.

17 junho, 2007

A Fórmula 1 em Indianápolis

Aproveitando que hoje tivemos o Grande Prêmio dos Estados Unidos em Indianápolis, com vitória de Lewis Hamilton (nunca vi um piloto tão novo andar tão rápido e errar tão pouco!), vamos relembrar um pouco da importância dessa pista para a Fórmula 1.

Pode-se dizer que Indianápolis é o coração do automobilismo norte-americano. O oval de 2 milhas e meia abriga as 500 Milhas de Indianápolis desde 1911, e é uma das corridas mais tradicionais e importantes do mundo. O vencedor das 500 milhas recebe prestígio comparado apenas aos vencedores de provas como as 24 Horas de Le Mans, ou o Grande Prêmio de Mônaco.

Para nós que somos mais novos, ou até para a geração anterior à minha, nascida já nos final dos anos 60, falar da Indy 500 num texto sobre Fórmula 1 pode parecer como misturar água e óleo. Contudo, a prova máxima do automobilismo americano e o campeonato Mundial de Fórmula 1 têm a sua história amalgamada por mais de 20 anos, desde 1950 até a metade dos anos 70. Isso sem falar nos pilotos de uma ou de outra categoria que se aventuraram do outro lado do Oceano.

Bill Vukovich, no dia em que perdeu a vida em IndianapolisQuando o Campeonato Mundial de Fórmula 1 foi criado, em 1950, a Indy 500 fazia parte. A pista ainda era pavimentada com tijolos e poerenta, e a prova era disputada com regras próprias. Já naquele tempo existia uma segregação, natural até, entre o automobilismo europeu (centrado em circuitos mistos, alguns muito longos como Nürburgring, Spa e AVUS) e o americano (desenvolvido em ovais). Como a Indy 500 exigia que os carros e motores tivessem uma construção diferente para suportar a carga de curvas sempre à esquerda com aceleração máxima a maior parte do tempo, as equipes européias não participavam da prova, pois os custos para a adaptação dos carros seriam inviáveis. A prova era, assim, disputada por construtores e pilotos locais, que, de forma semelhante, não tinham condições para preparar carros para competir tanto nas 500 Milhas como nas provas européias. Indianapolis estava no calendário e contava pontos para o mundial, mas para a Fórmula 1 ela tinha uma importância meramente decorativa - assim como o campeonato mundial não despertava muitas ambições entre os americanos.

As 500 Milhas permaneceram no calendário de 1950 a 1960, e nesse período o piloto mais bem sucedido foi Bill Vukovich. De 51 a 55 ele registrou uma pole-position, duas vitórias, e três melhores voltas, a última destas em 1955, quando morreu na pista após um acidente enquanto liderava a prova. Dos vencedores da prova naquela década, apenas dois se aventuraram na Fórmula 1 longe do oval: Troy Ruttman (vencedor em 52) disputou os GPs da França e da Alemanha em 58, com uma Maseratti, enquanto Roger Ward (vencedor em 59) disputou provas em Sebring e Watkins Glen, com chassis de fabricação americana.

A partir de 1960, Indy deixou o calendário da Fórmula 1. Mas seu prestígio continuou atraindo as atenções na Europa. Em 61, a Cooper fez uma tímida tentativa no oval americano, com Jack Brabham ao volante, obtendo resultados modestos. Eles usavam o mesmo modelo T54 que usaram nas provas do mundial com adaptações para Indianápolis, porém não foram o suficiente para fazer o carro original render no nível dos demais, construídos para aquele tipo de pista.

Em 1963 Colin Chapman, o fundador e o gênio por trás do sucesso da Lotus, também fez sua tentativa. Atraído pelo desafio, levou seu pupilo Jim Clark e Dan Gurney e seu chassis 29, projetado especialmente para o oval, o primeiro carro com motor traseiro a disputar a prova. Clark foi segundo colocado naquele ano, que também o veria campeão mundial de Fórmula 1 com o Lotus 25. No ano seguinte, além de ter o norte-americano Bob Marshman pilotando um modelo 29 particular, a Lotus participou das 500 Milhas com outra invenção, o modelo 34, que daria a Clark a pole. O britânico abandonou após um acidente enquanto liderava a prova. O norte-americano Parnelli Jones, que também corria na Fórmula 1, pilotou o mesmo modelo 34 ao longo do ano em ovais nos EUA, marcando uma pole.

Jimmy Clark posa como vencedor da Indy 500 com o Lotus 38 Em 65, finalmente o investimento valeu a pena. Parnelli Jones e o legendário A.J.Foyt III (o maior vencedor da história das 500 Milhas, e um verdadeiro mito por aqueles lados) tentaram a sorte com o Lotus 34 (Jones foi segundo na prova), enquanto a equipe oficial trazia seu novo modelo 38, com Gurney e Clark. Jimmy Clark simplesmente largou em segundo e venceu a corrida depois de liderar 190 voltas, fazendo da Lotus a primeira equipe de Fórmula 1, e Clark seu primeiro campeão, a vencer em Indianápolis.

Em 66 Dan Gurney já havia fundado sua equipe Eagle para disputar o campeonato de Fórmula 1, e trouxe um chassis especial para aquela edição da Indy 500, sem muita sorte. Já a Lotus trouxe de volta o modelo 38, e novamente arrebentou: desta vez, foi Graham Hill quem levou a taça, pilotando um carro vermelho, diferente do verde e amarelo tradicional da equipe inglesa. Hill se tornou, naquele ano, o primeiro piloto a vencer o GP de Mônaco e as 500 Milhas. Em 67, Clark e Hill voltaram a Indianápolis com o modelo 38, mas naquela altura a criação de Chapman já estava ultrapassada.

O Lotus 56 foi até capa de revistaPara 1968, Chapman projetou outro bólido pensando nas 500 Milhas e em seu piloto favorito, Clark. O Lotus 56 era algo totalmente diferente do que já havia sido visto. Com a frente baixa e ampla, e um desenho que lembrava uma asa, o modelo 56 ainda contava com uma turbina imbutida na traseira. Porém, Clark morreu ainda no começo do ano. A Lotus levou dois carros, com Graham Hill e o norte-americano Joe Leonard ao volante. O futuro campeão mundial daquele ano conseguiu o segundo melhor tempo na classificação (Leonard foi o pole), mas abandonou após uma batida. Gurney, com sua Eagle, terminou em segundo naquele ano, e Denny Hulme, campeão mundial em 67, chegou em quarto pilotando outra Eagle. A Lotus, sem Clark, nunca mais voltou a Indianápolis. Mas o modelo 56 apresenta os elementos básicos do que viria a ser o Lotus 72, que não só traria o título mundial para Jochen Rindt em 70 e Emerson Fittipaldi em 72, como também alteraria para sempre a maneira como os carros de Fórmula 1 eram concebidos. Este é o legado de Indianápolis para a Fórmula 1, a própria maneira como os carros são feitos.

O M16B pilotado por Peter RevsonA McLaren também passou pela Indy 500. Em 72 a equipe, então sob controle do ex-sócio do falecido Bruce McLaren, Ted Meyer, projetou o modelo M16, procurando nas linhas gerais copiar a fórmula de sucesso do Lotus 72. Pilotado por Peter Revson (e dois anos depois, por David Hobbs, numa versão modificada do chassis), o carro não obteve bons resultados. Porém este projeto conduziu ao nascimento do McLaren M23, que também daria um título a Emerson Fittipaldi, e dois anos mais tarde, a James Hunt. Ao longo dos anos 70 e 80, as britânicas March e Lola chegaram a deixar seus projetos na Fórmula 1 em segundo plano para se dedicarem a Indy e ao mercado americano, atingindo enorme sucesso.

Hoje em dia, as especificações técnicas da Fórmula 1 são tão limitantes, que um carro com sua configuração normal não só não acompanharia um carro da IRL, por exemplo, como também não resistiria muitas voltas sem quebrar num circuito oval. Para um Fórmula 1 atual disputar uma corrida de 200 voltas em pista oval, seria preciso construir novas suspensões, freios e câmbio, repensar a aerodinâmica, obter do fabricante pneus especiais e motores inteiramente novos, não só para atingir o máximo desempenho, mas também para garantir a segurança do piloto. Sairia quase tão caro quanto fabricar um carro novo.

Existem corridas que são maiores do que as categorias a que pertencem. Indy 500 é mais antiga que a Fórmula 1, foi incluída no calendário original por sua tradição, sobreviveu à saída do calendário com o vigor de um jovem, e continuou atraindo a atenção e a ambição de pilotos e equipes do mundo inteiro. Se a Fórmula 1 disputa hoje a oitava edição consecutiva do GP dos Estados Unidos no circuito misto de Indianápolis, não é só por uma manobra política de Bernie Ecclestone para atrair o público americano - pois poderia ser em qualquer outro lugar naquele país - nem tampouco por um traçado excepcionalmente emocionante, mas porque Indianápolis é a força que faz pulsar o coração do automobilismo internacional, de todo fã do esporte, e da própria História da Fórmula 1.

Fontes: Ghostmodels.com (fotos dos modelos), Formula One Facts, 8W, Answers.com (foto da revista), Vukovich Accident (incluindo foto), Bramwell, Indianapolis 500.