Talento para algo mais que pilotar
Quando pensamos em um piloto de Fórmula 1, pensamos primeiro em um profissional obcecado pelo que faz, simplesmente um sujeito que tem por talento natural guiar um carro o mais rápido possível. Claro que, se não fosse o caso, nenhum deles chegaria a uma competição automobilística de alto nível, mesmo aqueles pilotos que conseguem seu lugar mais por sua conta de patrocinadores pessoais do que por talento. Mas muitos pilotos também têm ou tinham uma afinidade ou uma habilidade natural incomum em outras atividades, que acabaram desenvolvendo como hobby, ou, após a aposentadoria ou mesmo paralelamente, como uma segunda atividade profissional.
Desde os anos 80, o estilo esportista adotado e divulgado por Ayrton Senna estimulou a prática de esportes e exercícios físicos como parte da preparação física e mental dos pilotos. Se antes um piloto de Fórmula 1 precisava apenas comparecer a testes, corridas, e eventos publicitários, sem se preocupar muito com a forma (e alguns pilotos nos anos 50 e 60 eram bem gordinhos, como o grande piloto argentino José Froilan González), a partir dali muitos adotaram a vida de um atleta. Senna tinha como hobby o jet ski, na época um esporte pouco conhecido no Brasil. Alguns esquiavam. Os pilotos da Ferrari, por sinal, ainda são quase obrigados a saber usar o esqui, já que faz parte do contrato passar as férias no resort da empresa nos alpes italianos e posar para a mídia internacional, de preferência, sem fazer feio na neve. Aliás, Rubens Barrichello aproveitava a oportunidade para vencer Michael Schumacher em corridas de trenós motorizados. Emerson Fittipaldi, depois de coroa, pilotava ultraleves, até se acidentar com um em sua fazenda, em São Paulo. O mesmo Schumacher levava um misto de preparador físico com guru espiritual a todas as corridas. Fernando Alonso é um dos pilotos atuais que mais leva a preparação física a sério.
Futebol é como um segundo esporte para quase todos os pilotos (exceto os americanos, claro), embora a maioria seja perna de pau. Nigel Mansell, por exemplo, torceu um tornozelo durante uma partida, em 91 ou 92, não lembro, e durante várias semanas ele subiu ao pódio apoiado numa bengala. O próprio Rubens é um peladeiro razoável, Jarno Trulli e Giancarlo Fisichella não perdem uma chance de entrar em campo, enquanto Michael Schumacher, por outro lado, é um centro-avante competente, fazendo muitos gols em partidas beneficentes, não poucas vezes aqui no Brasil e contra jogadores e ex-jogadores profissionais. O alemão até comprou um pequeno time na Suíça, onde, nos dias livres, ou quando lhe convém, joga como titular.
Vários jogam golfe, como Mansell. Keke Rosberg praticava tênis, assim como seu filho Nico. E não podemos esquecer daqueles que fizeram carreira em outras modalidades antes de chegar à Fórmula 1, como John Surtees (o único campeão mundial nesta categoria e em motovelocidade), Johnny Ceccoto, e, por um triz, Valentino Rossi, que tinha vaga quase certa na Ferrari este ano. Nem vou mencionar pilotos de outras categorias de ponta, como Alan McNish, Michael Andretti, ou Christjan Albers, porque, afinal, também aquelas eram corridas de carro de alto nível.
Outros tinham um faro especial para os negócios. É o caso de Emerson Fittipaldi, que ganhou muito mais dinheiro com sua produção de cítricos e com a administração de sua imagem do que como piloto. Ayrton Senna com sua irmã Viviane dirigiam a Fundação Ayrton Senna, que até hoje movimenta muita grana investindo em instituições voltadas a crianças carentes. Clay Regazzoni, depois do acidente que o tornou paraplégico em 1980, se tornou um dos mais ativos defensores dos direitos dos deficientes físicos pelo mundo. Nélson Piquet, que trabalhou como mecânico no início da carreira de piloto, foi pioneiro na instalação de um sistema de monitoramento via satélite de transportes de carga no Brasil. Niki Lauda e Keke Rosberg se tornaram concorrentes ao fundarem, cada um, uma empresa aérea. Huub Rothengatter agencia pilotos na Europa. E por que não mencionar o "hômi", Bernie Ecclestone, que, de piloto mediano que falhou em duas tentativas de se classificar para GPs nos anos 50, se tornou o dirigente mais poderoso da categoria e um dos mais ricos do mundo do esporte? E outros que se tornaram donos de equipes, como Jack Brabham, Dan Gurney, Surtees, Jackie Stewart, Guy Ligier, Gerrard Larrousse, Wilsinho Fittipaldi, Alain Prost, e companhia.
E houve, também, pilotos com uma veia artística mais forte. Slim Borgudd, ex-piloto de ATS e Tyrrell - e o meu piloto obscuro favorito! - era o baterista de estúdio do conjunto ABBA. O campeão Jacques Villeneuve também é músico agora, e já soltou a voz num CD lançado ano passado. Elio de Angelis tocava piano tão bem que diziam que ele poderia facilmente ter seguido a carreira de pianista de concertos. Johnny Dumfries é, além de um pintor de talento considerável, decorador e designer de móveis.
Outros revelaram-se bons comunicadores. Ivan Capelli se tornou comentarista da RAI, James Hunt e Martin Brundle da BBC, Luciano Burti da Globo. Patrick Tambay trabalhava como jornalista quando descobriu, em 92 ou 93, que a Ligier usava peças móveis no seu aerofólio traseiro - já naquela época se tentava burlar o regulamento.
Assim como ser piloto de corridas não exclui a possibilidade de desenvolver outros talentos não relacionados, também nada impede que profissionais de outras áreas - vide o caso do bateirista Slim Borgudd, que pilotou por duas temporadas e ainda marcou um ponto, ou o aristocrático Johhny Dumfries - venham a demonstrar um talento inesperado para o automobilismo. Lógico que, para chegar lá, é preciso desenvolver esta aptidão ao limite, e isso envolve tempo, investimento, esforço e abnegação. Mas já pensou, você que é advogado, eletricista, dentista (houve um dentista correndo as 500 Milhas de Indianápolis!), ou, no meu caso, botânico, se aventurar nas pistas sem grande perspectivas, e ser chamado para ser piloto de Fórmula 1? Não custa sonhar.
Fontes: BBC (foto), Slovenia News (foto), Bouboum - álbum no Photobucket (foto), PTN1.net (foto), Formula One Rejects.








Quando Stefano Modena não conseguiu obter classificação para o grid de largada para o GP da Itália de 1992, se viu duas cenas opostas nos boxes da Jordan: Eddie Jordan e os mecânicos exasperados de um lado, e o piloto abatido do outro. E durante a maior parte do ano foi assim. Modena era um sujeito fechado, e à medida que os resultados não vinham, ele se fechava mais e mais, a ponto de perder qualquer contato pessoal com a equipe à sua volta.
Quando o Campeonato Mundial de Fórmula 1 foi criado, em 1950, a Indy 500 fazia parte. A pista ainda era pavimentada com tijolos e poerenta, e a prova era disputada com regras próprias. Já naquele tempo existia uma segregação, natural até, entre o automobilismo europeu (centrado em circuitos mistos, alguns muito longos como Nürburgring, Spa e AVUS) e o americano (desenvolvido em ovais). Como a Indy 500 exigia que os carros e motores tivessem uma construção diferente para suportar a carga de curvas sempre à esquerda com aceleração máxima a maior parte do tempo, as equipes européias não participavam da prova, pois os custos para a adaptação dos carros seriam inviáveis. A prova era, assim, disputada por construtores e pilotos locais, que, de forma semelhante, não tinham condições para preparar carros para competir tanto nas 500 Milhas como nas provas européias. Indianapolis estava no calendário e contava pontos para o mundial, mas para a Fórmula 1 ela tinha uma importância meramente decorativa - assim como o campeonato mundial não despertava muitas ambições entre os americanos.
Em 65, finalmente o investimento valeu a pena. Parnelli Jones e o legendário A.J.Foyt III (o maior vencedor da história das 500 Milhas, e um verdadeiro mito por aqueles lados) tentaram a sorte com o Lotus 34 (Jones foi segundo na prova), enquanto a equipe oficial trazia seu novo modelo 38, com Gurney e Clark. Jimmy Clark simplesmente largou em segundo e venceu a corrida depois de liderar 190 voltas, fazendo da Lotus a primeira equipe de Fórmula 1, e Clark seu primeiro campeão, a vencer em Indianápolis.
Para 1968, Chapman projetou outro bólido pensando nas 500 Milhas e em seu piloto favorito, Clark. O Lotus 56 era algo totalmente diferente do que já havia sido visto. Com a frente baixa e ampla, e um desenho que lembrava uma asa, o modelo 56 ainda contava com uma turbina imbutida na traseira. Porém, Clark morreu ainda no começo do ano. A Lotus levou dois carros, com Graham Hill e o norte-americano Joe Leonard ao volante. O futuro campeão mundial daquele ano conseguiu o segundo melhor tempo na classificação (Leonard foi o pole), mas abandonou após uma batida. Gurney, com sua Eagle, terminou em segundo naquele ano, e Denny Hulme, campeão mundial em 67, chegou em quarto pilotando outra Eagle. A Lotus, sem Clark, nunca mais voltou a Indianápolis. Mas o modelo 56 apresenta os elementos básicos do que viria a ser o Lotus 72, que não só traria o título mundial para Jochen Rindt em 70 e Emerson Fittipaldi em 72, como também alteraria para sempre a maneira como os carros de Fórmula 1 eram concebidos. Este é o legado de Indianápolis para a Fórmula 1, a própria maneira como os carros são feitos.
A McLaren também passou pela Indy 500. Em 72 a equipe, então sob controle do ex-sócio do falecido Bruce McLaren, Ted Meyer, projetou o modelo M16, procurando nas linhas gerais copiar a fórmula de sucesso do Lotus 72. Pilotado por Peter Revson (e dois anos depois, por David Hobbs, numa versão modificada do chassis), o carro não obteve bons resultados. Porém este projeto conduziu ao nascimento do McLaren M23, que também daria um título a Emerson Fittipaldi, e dois anos mais tarde, a James Hunt. Ao longo dos anos 70 e 80, as britânicas March e Lola chegaram a deixar seus projetos na Fórmula 1 em segundo plano para se dedicarem a Indy e ao mercado americano, atingindo enorme sucesso.
O tio de "Piero", Giancarlo, também era piloto, contudo sua maior façanha foi bater com uma Ferrari emprestada durante o warm up da Corrida dos Campeões de 1976, em Brands Hatch. Pierluigi mostrara ter um futuro mais promissor. Aos 22 anos vencera o europeu de Fórmula 3, e já tinha seus contatos na Fórmula 1. Apesar da experiência com a Toleman tê-lo deixado arrasado, ele logo se envolveu em um novo projeto para o ano seguinte.
Giancarlo queria
Em 94 Minardi se livrou de Fittipaldi, que mudara para a Arrows, e manteve Martini para fazer dupla com
Felizmente, ele continuou a correr. Em 1999, Martini,
Após aquele fim de semana, ele procurou Eddie Jordan, agradeceu pela oportunidade, e, com acordo de ambas as partes, pediu demissão. Foi a última vez que o ex-futuro campeão, que escalou sua trilha com a ajuda de amigos, que foi fiel aos que lhe davam oportunidades de buscar um sonho, sentou num Fórmula 1. Hoje, muitos anos depois, recuperado do golpe que foi a temporada na Ferrari, Capelli voltou a ser a figura amistosa que cativou fãs e amigos ao longo da carreira. Muito tempo após a tormenta, seja trabalhando como comentarista da RAI Uno ou apenas em suas constantes presenças pelo paddock, o amável Ivan voltou a sorrir.