17 junho, 2007

A Fórmula 1 em Indianápolis

Aproveitando que hoje tivemos o Grande Prêmio dos Estados Unidos em Indianápolis, com vitória de Lewis Hamilton (nunca vi um piloto tão novo andar tão rápido e errar tão pouco!), vamos relembrar um pouco da importância dessa pista para a Fórmula 1.

Pode-se dizer que Indianápolis é o coração do automobilismo norte-americano. O oval de 2 milhas e meia abriga as 500 Milhas de Indianápolis desde 1911, e é uma das corridas mais tradicionais e importantes do mundo. O vencedor das 500 milhas recebe prestígio comparado apenas aos vencedores de provas como as 24 Horas de Le Mans, ou o Grande Prêmio de Mônaco.

Para nós que somos mais novos, ou até para a geração anterior à minha, nascida já nos final dos anos 60, falar da Indy 500 num texto sobre Fórmula 1 pode parecer como misturar água e óleo. Contudo, a prova máxima do automobilismo americano e o campeonato Mundial de Fórmula 1 têm a sua história amalgamada por mais de 20 anos, desde 1950 até a metade dos anos 70. Isso sem falar nos pilotos de uma ou de outra categoria que se aventuraram do outro lado do Oceano.

Bill Vukovich, no dia em que perdeu a vida em IndianapolisQuando o Campeonato Mundial de Fórmula 1 foi criado, em 1950, a Indy 500 fazia parte. A pista ainda era pavimentada com tijolos e poerenta, e a prova era disputada com regras próprias. Já naquele tempo existia uma segregação, natural até, entre o automobilismo europeu (centrado em circuitos mistos, alguns muito longos como Nürburgring, Spa e AVUS) e o americano (desenvolvido em ovais). Como a Indy 500 exigia que os carros e motores tivessem uma construção diferente para suportar a carga de curvas sempre à esquerda com aceleração máxima a maior parte do tempo, as equipes européias não participavam da prova, pois os custos para a adaptação dos carros seriam inviáveis. A prova era, assim, disputada por construtores e pilotos locais, que, de forma semelhante, não tinham condições para preparar carros para competir tanto nas 500 Milhas como nas provas européias. Indianapolis estava no calendário e contava pontos para o mundial, mas para a Fórmula 1 ela tinha uma importância meramente decorativa - assim como o campeonato mundial não despertava muitas ambições entre os americanos.

As 500 Milhas permaneceram no calendário de 1950 a 1960, e nesse período o piloto mais bem sucedido foi Bill Vukovich. De 51 a 55 ele registrou uma pole-position, duas vitórias, e três melhores voltas, a última destas em 1955, quando morreu na pista após um acidente enquanto liderava a prova. Dos vencedores da prova naquela década, apenas dois se aventuraram na Fórmula 1 longe do oval: Troy Ruttman (vencedor em 52) disputou os GPs da França e da Alemanha em 58, com uma Maseratti, enquanto Roger Ward (vencedor em 59) disputou provas em Sebring e Watkins Glen, com chassis de fabricação americana.

A partir de 1960, Indy deixou o calendário da Fórmula 1. Mas seu prestígio continuou atraindo as atenções na Europa. Em 61, a Cooper fez uma tímida tentativa no oval americano, com Jack Brabham ao volante, obtendo resultados modestos. Eles usavam o mesmo modelo T54 que usaram nas provas do mundial com adaptações para Indianápolis, porém não foram o suficiente para fazer o carro original render no nível dos demais, construídos para aquele tipo de pista.

Em 1963 Colin Chapman, o fundador e o gênio por trás do sucesso da Lotus, também fez sua tentativa. Atraído pelo desafio, levou seu pupilo Jim Clark e Dan Gurney e seu chassis 29, projetado especialmente para o oval, o primeiro carro com motor traseiro a disputar a prova. Clark foi segundo colocado naquele ano, que também o veria campeão mundial de Fórmula 1 com o Lotus 25. No ano seguinte, além de ter o norte-americano Bob Marshman pilotando um modelo 29 particular, a Lotus participou das 500 Milhas com outra invenção, o modelo 34, que daria a Clark a pole. O britânico abandonou após um acidente enquanto liderava a prova. O norte-americano Parnelli Jones, que também corria na Fórmula 1, pilotou o mesmo modelo 34 ao longo do ano em ovais nos EUA, marcando uma pole.

Jimmy Clark posa como vencedor da Indy 500 com o Lotus 38 Em 65, finalmente o investimento valeu a pena. Parnelli Jones e o legendário A.J.Foyt III (o maior vencedor da história das 500 Milhas, e um verdadeiro mito por aqueles lados) tentaram a sorte com o Lotus 34 (Jones foi segundo na prova), enquanto a equipe oficial trazia seu novo modelo 38, com Gurney e Clark. Jimmy Clark simplesmente largou em segundo e venceu a corrida depois de liderar 190 voltas, fazendo da Lotus a primeira equipe de Fórmula 1, e Clark seu primeiro campeão, a vencer em Indianápolis.

Em 66 Dan Gurney já havia fundado sua equipe Eagle para disputar o campeonato de Fórmula 1, e trouxe um chassis especial para aquela edição da Indy 500, sem muita sorte. Já a Lotus trouxe de volta o modelo 38, e novamente arrebentou: desta vez, foi Graham Hill quem levou a taça, pilotando um carro vermelho, diferente do verde e amarelo tradicional da equipe inglesa. Hill se tornou, naquele ano, o primeiro piloto a vencer o GP de Mônaco e as 500 Milhas. Em 67, Clark e Hill voltaram a Indianápolis com o modelo 38, mas naquela altura a criação de Chapman já estava ultrapassada.

O Lotus 56 foi até capa de revistaPara 1968, Chapman projetou outro bólido pensando nas 500 Milhas e em seu piloto favorito, Clark. O Lotus 56 era algo totalmente diferente do que já havia sido visto. Com a frente baixa e ampla, e um desenho que lembrava uma asa, o modelo 56 ainda contava com uma turbina imbutida na traseira. Porém, Clark morreu ainda no começo do ano. A Lotus levou dois carros, com Graham Hill e o norte-americano Joe Leonard ao volante. O futuro campeão mundial daquele ano conseguiu o segundo melhor tempo na classificação (Leonard foi o pole), mas abandonou após uma batida. Gurney, com sua Eagle, terminou em segundo naquele ano, e Denny Hulme, campeão mundial em 67, chegou em quarto pilotando outra Eagle. A Lotus, sem Clark, nunca mais voltou a Indianápolis. Mas o modelo 56 apresenta os elementos básicos do que viria a ser o Lotus 72, que não só traria o título mundial para Jochen Rindt em 70 e Emerson Fittipaldi em 72, como também alteraria para sempre a maneira como os carros de Fórmula 1 eram concebidos. Este é o legado de Indianápolis para a Fórmula 1, a própria maneira como os carros são feitos.

O M16B pilotado por Peter RevsonA McLaren também passou pela Indy 500. Em 72 a equipe, então sob controle do ex-sócio do falecido Bruce McLaren, Ted Meyer, projetou o modelo M16, procurando nas linhas gerais copiar a fórmula de sucesso do Lotus 72. Pilotado por Peter Revson (e dois anos depois, por David Hobbs, numa versão modificada do chassis), o carro não obteve bons resultados. Porém este projeto conduziu ao nascimento do McLaren M23, que também daria um título a Emerson Fittipaldi, e dois anos mais tarde, a James Hunt. Ao longo dos anos 70 e 80, as britânicas March e Lola chegaram a deixar seus projetos na Fórmula 1 em segundo plano para se dedicarem a Indy e ao mercado americano, atingindo enorme sucesso.

Hoje em dia, as especificações técnicas da Fórmula 1 são tão limitantes, que um carro com sua configuração normal não só não acompanharia um carro da IRL, por exemplo, como também não resistiria muitas voltas sem quebrar num circuito oval. Para um Fórmula 1 atual disputar uma corrida de 200 voltas em pista oval, seria preciso construir novas suspensões, freios e câmbio, repensar a aerodinâmica, obter do fabricante pneus especiais e motores inteiramente novos, não só para atingir o máximo desempenho, mas também para garantir a segurança do piloto. Sairia quase tão caro quanto fabricar um carro novo.

Existem corridas que são maiores do que as categorias a que pertencem. Indy 500 é mais antiga que a Fórmula 1, foi incluída no calendário original por sua tradição, sobreviveu à saída do calendário com o vigor de um jovem, e continuou atraindo a atenção e a ambição de pilotos e equipes do mundo inteiro. Se a Fórmula 1 disputa hoje a oitava edição consecutiva do GP dos Estados Unidos no circuito misto de Indianápolis, não é só por uma manobra política de Bernie Ecclestone para atrair o público americano - pois poderia ser em qualquer outro lugar naquele país - nem tampouco por um traçado excepcionalmente emocionante, mas porque Indianápolis é a força que faz pulsar o coração do automobilismo internacional, de todo fã do esporte, e da própria História da Fórmula 1.

Fontes: Ghostmodels.com (fotos dos modelos), Formula One Facts, 8W, Answers.com (foto da revista), Vukovich Accident (incluindo foto), Bramwell, Indianapolis 500.

2 comentários:

Pezzolo disse...

adorei seu blog, vou linkar com o meu. nao vejo a hora de ler sobre stefano modena, eu sempre gostei muito dele!

Anônimo disse...

Muito legal su blog parabens!!!
www.paddockformula1.blogspot.com